sábado, 29 de setembro de 2012

Frase do Dia

"Não haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses."


Rubem Alves

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Dica de Fim de Semana - A Invenção de Hugo Cabret



Sinopse:

A história acompanha Hugo (Asa Butterfield), um garoto de 12 anos que vive em uma estação de trem em Paris no começo do século 20. Seu pai, um relojoeiro que trabalhava em um museu, morre momentos depois de mostrar a Hugo a sua última descoberta: um androide, sentado numa escrivaninha, com uma caneta na mão, aguardando para escrever uma importante mensagem. O problema é que o menino não consegue ligar o robô, nem resolver o mistério.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Texto que Agitou a Espanha - "Um canhão pelo cu"



Escritor espanhol, autor de livros de sucesso (El Desorden de tu Nombre, La Soledad era esto, entre outros), jornalista, o espanhol de Valência Juan José Millás, 66 anos, agitou a Espanha e boa parte da Europa ao publicar em agosto uma coluna (veja abaixo) sobre a crise atual e duramente crítica ao sistema capitalista.

Virou o texto mais lido do jornal El País, ganhou espaço nas redes sociais, passou a ser divulgado por leitores comuns, ganhou debates. Millás fala da crise espanhola e sobre o torniquete manejado pelo banco europeu que sufoca o país, mas é um texto que serve para todo o mundo – inclusive para países que não sofrem tanto com a crise.

Há algum tempo, criticar o capitalismo era quase proibido. Qualquer restrição sempre era rebatida com aquela velha bobagem de que o crítico era de esquerda, comunista, agitador e mais alguns anacronismos. Felizmente, a crise ensinou que nenhum sistema está livre de críticas e de distorções – como Millás mostra na sua coluna.

Vale a pena ler com atenção o texto que peço licença a Millás (foto) para reproduzir, com orgulho, aqui no blog:

“Um canhão pelo cu

Se percebemos bem – e não é fácil, porque somos um bocado tontos -, a economia financeira é a economia real do senhor feudal sobre o servo, do amo sobre o escravo, da metrópole sobre a colónia, do capitalista manchesteriano sobre o trabalhador explorado. A economia financeira é o inimigo da classe da economia real, com a qual brinca como um porco ocidental com corpo de criança num bordel asiático.

Esse porco filho da puta pode, por exemplo, fazer com que a tua produção de trigo se valorize ou desvalorize dois anos antes de sequer ser semeada. Na verdade, pode comprar-te, sem que tu saibas da operação, uma colheita inexistente e vendê-la a um terceiro, que a venderá a um quarto e este a um quinto, e pode conseguir, de acordo com os seus interesses, que durante esse processo delirante o preço desse trigo quimérico dispare ou se afunde sem que tu ganhes mais caso suba, apesar de te deixar na merda se descer.

Se o preço baixar demasiado, talvez não te compense semear, mas ficarás endividado sem ter o que comer ou beber para o resto da tua vida e podes até ser preso ou condenado à forca por isso, dependendo da região geográfica em que estejas – e não há nenhuma segura. É disso que trata a economia financeira.

Para exemplificar, estamos a falar da colheita de um indivíduo, mas o que o porco filho da puta compra geralmente é um país inteiro e ao preço da chuva, um país com todos os cidadãos dentro, digamos que com gente real que se levanta realmente às seis da manhã e se deita à meia-noite. Um país que, da perspetiva do terrorista financeiro, não é mais do que um jogo de tabuleiro no qual um conjunto de bonecos Playmobil andam de um lado para o outro como se movem os peões no Jogo da Glória.

A primeira operação do terrorista financeiro sobre a sua vítima é a do terrorista convencional: o tiro na nuca. Ou seja, retira-lhe todo o caráter de pessoa, coisifica-a. Uma vez convertida em coisa, pouco importa se tem filhos ou pais, se acordou com febre, se está a divorciar-se ou se não dormiu porque está a preparar-se para uma competição. Nada disso conta para a economia financeira ou para o terrorista económico que acaba de pôr o dedo sobre o mapa, sobre um país – este, por acaso -, e diz “compro” ou “vendo” com a impunidade com que se joga Monopólio e se compra ou vende propriedades imobiliárias a fingir.

Quando o terrorista financeiro compra ou vende, converte em irreal o trabalho genuíno dos milhares ou milhões de pessoas que antes de irem trabalhar deixaram na creche pública – onde estas ainda existem – os filhos, também eles produto de consumo desse exército de cabrões protegidos pelos governos de meio mundo mas sobreprotegidos, desde logo, por essa coisa a que chamamos Europa ou União Europeia ou, mais simplesmente, Alemanha, para cujos cofres estão a ser desviados neste preciso momento, enquanto lê estas linhas, milhares de milhões de euros que estavam nos nossos cofres.
E não são desviados num movimento racional, justo ou legítimo, são-no num movimento especulativo promovido por Merkel com a cumplicidade de todos os governos da chamada zona euro.

Tu e eu, com a nossa febre, os nossos filhos sem creche ou sem trabalho, o nosso pai doente e sem ajudas, com os nossos sofrimentos morais ou as nossas alegrias sentimentais, tu e eu já fomos coisificados por Draghi, por Lagarde, por Merkel, já não temos as qualidades humanas que nos tornam dignos da empatia dos nossos semelhantes. Somos simples mercadoria que pode ser expulsa do lar de idosos, do hospital, da escola pública, tornámo-nos algo desprezível, como esse pobre tipo a quem o terrorista, por antonomásia, está prestes a dar um tiro na nuca em nome de Deus ou da pátria.

A ti e a mim, estão a pôr nos vagões do trem uma bomba diária chamada prémio de risco, por exemplo, ou juros a sete anos, em nome da economia financeira. Avançamos com ruturas diárias, massacres diários, e há autores materiais desses atentados e responsáveis intelectuais dessas ações terroristas que passam impunes entre outras razões porque os terroristas vão a eleições e até ganham, e porque há atrás deles importantes grupos mediáticos que legitimam os movimentos especulativos de que somos vítimas.

A economia financeira, se começamos a perceber, significa que quem te comprou aquela colheita inexistente era um cabrão com os documentos certos. Terias tu liberdade para não vender? De forma alguma. Tê-la-ia comprado ao teu vizinho ou ao vizinho deste. A atividade principal da economia financeira consiste em alterar o preço das coisas, crime proibido quando acontece em pequena escala, mas encorajado pelas autoridades quando os valores são tamanhos que transbordam dos gráficos.

Aqui se modifica o preço das nossas vidas todos os dias sem que ninguém resolva o problema, ou mais, enviando as autoridades para cima de quem tenta fazê-lo. E, por Deus, as autoridades empenham-se a fundo para proteger esse filho da puta que te vendeu, recorrendo a um esquema legalmente permitido, um produto financeiro, ou seja, um objeto irreal no qual tu investiste, na melhor das hipóteses, toda a poupança real da tua vida. Vendeu fumaça, o grande porco, apoiado pelas leis do Estado que são as leis da economia financeira, já que estão ao seu serviço.

Na economia real, para que uma alface nasça, há que semeá-la e cuidar dela e dar-lhe o tempo necessário para se desenvolver. Depois, há que a colher, claro, e embalar e distribuir e faturar a 30, 60 ou 90 dias. Uma quantidade imensa de tempo e de energia para obter uns cêntimos que terás de dividir com o Estado, através dos impostos, para pagar os serviços comuns que agora nos são retirados porque a economia financeira tropeçou e há que tirá-la do buraco. A economia financeira não se contenta com a mais-valia do capitalismo clássico, precisa também do nosso sangue e está nele, por isso brinca com a nossa saúde pública e com a nossa educação e com a nossa justiça da mesma forma que um terrorista doentio, passo a redundância, brinca enfiando o cano da sua pistola no rabo do sequestrado.

Há já quatro anos que nos metem esse cano pelo rabo. E com a cumplicidade dos nossos difusores das idéias neoliberais.

domingo, 23 de setembro de 2012

AREZZO - Uma Região Escondida em Toscana


Região Toscana em Italia
Visitar a região da Toscana, uma das mais belas da Itália, e não ir a Arezzo, no caminho entre Florença e Roma, às margens do Rio Arno, é um pecado quase mortal. Fora dos tradicionais roteiros turísticos (leia-se: não há hordas de gente e horas de fila em cada monumento), as muralhas de seu Centro Histórico guardam verdadeiros tesouros da arte e da arquitetura de vários momentos da história da humanidade. É de encher os olhos e o cartão de memória da câmera fotográfica.

As edificações com torres típicas da Idade Média, os arcos romanos, as fachadas renascentistas, as igrejas revestidas de pedras, museus com peças etruscas e romanas e até ruínas de um anfiteatro romano estão lá, distantes alguns metros um do outro. E, por dentro desses monumentos todos, pinturas e afrescos de tirar o fôlego. Basta um dia para se viver uma verdadeira viagem ao passado.

Rosângela Espinossi

Rosângela Espinossi

A catedral

Saindo da igreja, sobe-se uma ladeira bem em frente (Via Cesalpino) e encontra-se a catedral ou duomo da cidade. Sua construção foi iniciada na segunda metade do século XIII e finalizada no início do século XX (com o campanário e a fachada). Lá está outro afresco, pequeno, de Piero della Francesca: Madalena. 

Das escadarias externas (de 1524) observa-se a onipresente torre do Palazzo Comunale. Anda-se um pouco mais (Via Ricasoli), vira-se uma esquina (Via dei Pileati), desce-se uma ladeira (Corso Itália) e chega-se à igreja Santa Maria della Pieve, com suas deliciosas fileiras românicas de arcos e colunas na fachada.

Rosângela Espinossi

Uma grande praça

Não bastasse tudo isso, Arezzo ainda presenteia o turista com a Piazza Grande, o coração do Centro Histórico. Em forma de trapézio, o espaço fica num plano inclinado e é cercado por prédios medievais (as torres de novo) e renascentistas, como as arcadas da galeria, projetada pelo pintor, arquiteto e escritor Giorgio Vasari, que nasceu em Arezzo em 1511, e foi o primeiro a grafar o termo Renascimento em seus livros. Aliás, sua casa, construída em 1540, agora abriga um museu em sua homenagem. 

Na Piazza Grande, todo primeiro domingo do mês acontece, há 40 anos, a tradicionalíssima Feira de Antiguidades, uma das mais importantes da Europa. É lá também que duas vezes por ano (no primeiro domingo de setembro e na noite do penúltimo sábado de junho) realiza-se a Giostra del Saracino. Uma evocação aos tempos medievais, com disputa entre cavaleiros, roupas típicas, bandeiras e tudo o mais de direito. 

Ao sul do Centro Histórico ficam o Museu Arqueológico e o Anfiteatro Romano, na via Margaritone, paralela ao Corso Itália. Lá estão as ruínas da primeira fase da cidade, cuja origem remonta aos etruscos.




Rosângela Espinossi

Dica: Arezzo foi o cenário do filme A Vida é Bela (1997), de Roberto Benigni, em que um judeu que inventa toda uma história para proteger seu filho, durante a perseguição aos judeus na Itália na 2ª Guerra Mundial. Se você ainda não viu esse filme, assista-o antes de visitar Arezzo ou logo que você chegar de volta em casa! O filme é maravilhoso e ganhou vários prêmios, entre eles o Oscar de melhor ator, melhor filme estrangeiro e melhor música original.
Abaixo, vejam o trailer!




A culpa do povo




O Brasil é uma porcaria porque o povo brasileiro é uma porcaria. E, antes que alguém proteste, protesto eu que não vai aí nenhuma consideração racial, pela límpida razão de que raça não existe. Inclusive, o que há de melhor no Brasil é a miscigenação. Entre o final dos anos 30 e a arrancada dos 40, Stefan Zweig viveu seis meses no Rio e escreveu um livro ingênuo em quase tudo, Brasil, o País do Futuro. O livro só não era ingênuo na percepção que Zweig teve da macia integração de povos diferentes no Brasil, ao contrário do que ocorria na Europa belicosa e racista. O estrangeiro chega aqui e vira brasileiro no mesmo dia. Chamam-no de alemão, se for loiro; de turco, se for de algum país vagamente árabe; de japonês, se tiver olhos amendoados; e tudo isso significa que ele será igual a qualquer outro para partilhar uma cerveja ou para ser assaltado.

O problema do brasileiro não é este. O problema do brasileiro é moral. Há quem diga que “as elites” brasileiras têm culpa de tudo o que há de ruim no país. Trata-se de um pensamento elitista, que acredita que a “boa elite” constrói um país mais justo. As elites são tão ruins quanto o resto da população que refocila sob elas. Tome o exemplo da corrupção: um povo que não é corrupto não elege, repetidamente, Congressos corruptos. O brasileiro elege. No Exterior, o brasileiro tem fama de ser ladrão. É o que nós somos. Somos ladrões, egoístas, trapaceiros e vulgares. E somos tudo isso do alto das elites que sobrevoam São Paulo de helicóptero ao subsolo de quem sobrevive com a Bolsa-Família no Nordeste profundo. O brasileiro, em geral, e quando falo em geral é, sim, uma generalização, a sua avó pode ser uma exceção, pois o brasileiro em geral é um deficiente moral, seja qual for sua classe social ou sua conta bancária. Nosso Congresso nos representa bem.

O Brasil de hoje não tem jeito, nem tem saída. Certas fronteiras morais foram ultrapassadas, e agora não há mais como voltar. Não é o crescimento econômico que vai ajudar o país, como se acredita. Se o governo destinar R$ 20 mil mensais vitalícios a cada brasileiro, o Brasil não vai melhorar. Talvez piore.

A única solução para o Brasil está no título do pueril livro de Stefan Zweig. É pensar no país do futuro. Nas crianças. Os brasileiros, nós todos, devíamos fazer um pacto: tudo o que construiremos, daqui para frente, será para as crianças. Esqueçamos de nós mesmos, nós velhos, nós adultos, e pensemos nas crianças. Só elas, daqui a 30 ou 40 anos, terão chance de viver num país em que as pessoas não tenham medo de ser assaltadas e, depois, atropeladas pelo próprio carro roubado, como ocorreu dias atrás com um homem de 80 anos de idade em Porto Alegre. Só elas poderão, talvez, sair de casa sem ter de levar um “kit assalto”, como recomendam especialistas em segurança. Só elas, quem sabe, se orgulharão de seus eleitos, em vez de se envergonhar deles. Só elas terão possibilidade de morar num lugar em que as pessoas se respeitam, e não desconfiam umas das outras.

As crianças.

Só as crianças podem fazer com que, bem depois do nosso desaparecimento, o Brasil seja, de fato, o país do futuro.

* Texto publicado na Zero Hora nesta sexta-feira, 21 de setembro.

sábado, 15 de setembro de 2012

Frase do Dia

"Não tente só ser melhor que seus contemporâneos ou predecessores, tente ser melhor que você mesmo."

Faulkner

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Dica de Fim de Semana - A Mulher de Preto




Sinopse:

O jovem advogado londrino Arthur Kipps (Daniel Radcliffe) é forçado a deixar seu filho de três anos e viajar para a pequena vila de Crythin Gifford para tratar dos assuntos do recentemente falecido dono da Casa Eel Marsh. Mas quando ele chega à arrepiante mansão, descobre segredos obscuros no passado da cidade. Sua sensação de mal-estar aumenta quando ele vislumbra uma misteriosa mulher toda vestida de preto.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

A VERDADE SOBRE A REDUÇÃO DO PREÇO DE ENERGIA ELÉTRICA....





Dedico este texto aos brasileiros lúcidos e inteligentes... mas também aos analfabetos políticos que já estão falando bobagens por aí... especialmente aos que... pateticamente... "sentem vergonha de ser brasileiros"... 
(....)

5 pontos-chave sobre a redução do preço da energia elétrica

Confira os pontos altos do pacote de corte do custo da energia elétrica anunciado nesta terça-feira pelo governo brasileiro

Vanessa Barbosa, de Exame


São Paulo – A partir de janeiro de 2013, os consumidores brasileiros vão pagar em média 20,2% menos pela energia que consomem. O corte é reflexo de um pacote de redução de custos da energia elétrica anunciado nesta terça-feira pelo governo. Para atingir a modicidade tarifária, o governo vai atuar em três frentes: eliminação e redução de encargos, renovação das concessões de geração, transmissão e distribuição mediante comprometimento das empresas com critérios de qualidade, além de um aporte anual bilionário da União no sistema elétrico.

“Essas medidas são um passo importante para a redução das tarifas de energia, sejam as residenciais ou industriais”, diz Carlos Faria, presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace). “Mas ainda há espaço para mais”, salienta, lembrando que encargos e taxas representam apenas metade da conta de energia (veja infográfico).

Outros 50% da tarifa são formados basicamente de impostos estaduais e federais, que sequer foram citados no anúncio. "Ainda assim, o pacote é positivo", avalia João Carlos Mello, da consultoria Andrade & Canellas. “Principalmente para o setor industrial, que está com o PIB patinando. É uma visão de eficiência”, afirma. Confira a seguir estes e outros pontos importantes do pacote de energia que pretende ajudar a colocar a indústria e a economia brasileira nos trilhos:

1 - Adeus encargos “sem razão de ser”

Dois encargos (de um total de 13 que incidem sobre a tarifa de energia elétrica) serão eliminados. O primeiro é a Reserva Global de Reversão (RGR), que surgiu há mais de 50 anos com a finalidade de arrecadar dinheiro para um fundo destinado a cobrir indenizações de eventuais reversões nas concessões do setor elétrico.

Uma vez que o governo vai permitir a renovação das concessões, esse encargo - que tem reservas de R$ 16 bilhões - perde o motivo de existir. De acordo com o governo, a cobrança da RGR será extinta para as distribuidoras, para novos empreendimentos de geração e para as concessões prorrogadas.

Outro encargo que será eliminado é o Conta Consumo Combustível (CCC), que serve para subsidiar o uso de combustíveis por termelétricas em sistemas isolados, regiões não atendidas pelas linhas de transmissão do Sistema Interligado Nacional, como localidades do Norte. Com a expansão das redes, esse encargo (que arrecadou R$ 5,9 bilhões em 2011), torna-se praticamente dispensável.

Um terceiro encargo, a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que serve para subsidiar as tarifas de energia dos consumidores de baixa renda e universalizar o atendimento por meio do Programa Luz Para Todos, será reduzida em 75%. Os programas sociais não serão prejudicados, segundo o governo.

2 - Injeção bilionária de recursos

O pacote de energia prevê um aporte anual de 3,3 bilhões de reais da União no setor elétrico brasileiro, o que vai contribuir para uma maior modicidade tarifária e evitar cortes nos programas beneficiados pelos recursos dos encargos reduzidos. De acordo com o secretário do Tesouro Nacional, Arno Austin, parte dos recursos que serão transferidos ao sistema elétrico terão origem nos valores que a usina Binacional de Itaipu paga pela dívida que tem com o governo.

3 - Concessões: para prorrogar, vai ter que melhorar

Concessões de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica que vão vencer entre 2015 e 2017 poderão ser prorrogadas. Mas para renovarem seus contratos, as concessionárias vão ter que cumprir critérios de qualidade e fazer investimentos contínuos para garantir a melhoria do serviço.

Ao todo, existem 20 concessões vincendas na área de geração, representando 18% do parque gerador nacional. Na transmissão, são nove contratos com vencimento em 2015 (67% do sistema interligado nacional). Já na distribuição, são 44 contratos, com vencimento entre 2015 e 2016 (35% do mercado nacional).

A queda na tarifa de energia elétrica para os consumidores domésticos será de 16,2% e começará a valer a partir de 2013. A eliminação de encargos, acompanhadas do montante que a União aportará no setor, responde por 5,3% dessa baixa. Os outros 10,8% , segundo o governo, decorrem da redução da tarifa média de geração e da Receita Anual Permitida de transmissão, visto que essas concessões não terão mais ativos a depreciar ou amortizar.

5 - Redução para o setor produtivo

Já a queda na tarifa de energia elétrica para os consumidores industriais vai variar de 9% a 28%, dependendo da tensão. Os consumidores de alta tensão, principalmente os energo-intensivos, tais como a indústria de aço, o alumínio ou o cimento, deverão se beneficiar de um corte maior na tarifa final. Em nota, a Confederação Nacional das Indústrias prevê que a medida pode ajudar a reduzir em 4% o custo direto de produção industrial.


sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Hino Brasileiro (Seleção)



Por Luiz Guilherme Piva*


1. Ipiranga
Falta água.
Melhor, menos, que se espalhe
pela malha de veios do subsolo
e irrigue o mapa, o território, golfeje.
Artérias, dutos de água,
da vida que há nas águas,
caudalosas, densas, veredas.
Vida límpida,
que se veria de muito alto
correndo azul
sob a pele do relevo.

2. O povo
De heróis,
de malandros, de indiferentes,
de ora de um jeito, ora de outro,
de muitos jeitos ao mesmo tempo.
Como todos e todos os povos.
Aliás, não povos, mas gentes.

3. O brado
Há gritos que explodem no ar,
que vibram no espaço e no tempo,
pairam nítidos e audíveis
– relâmpagos.
Outros que não retumbam:
são lançados adentro,
ruminados no oco vil
do estômago.

4. Céu da pátria
Como se fora possível
recortar no firmamento
os contornos do torrão
– e o desenho da harpa suspensa
guardasse a liberdade e a fartura
que faltam a seu molde no chão.

5. Braço forte
Desafia no teu tórax
a desigualdade cínica
e afirma a dignidade
seja a cérebro
seja a bíceps

6. O sonho
Meu filho na entrada da área,
meia-esquerda, de sem-pulo,
a bola voa e estoura
no ângulo.

E vibrar como um dia
meu pai pulando na sala
com o coração do Brasil
estufando a rede
de Guadalajara.

7. Colosso
Machado;
Mário, Rosa, Drummond e Cabral;
Pixinguinha, Villa e Noel;
Chico e Veríssimo;
Pelé.

8. Mais garrida
Mestiça,
vestido de flor.
Dourada,
saindo do mar.
Negra,
os olhos solares.

E as meninas brejeiras
nas ruas do interior.

9. Campos
Falta terra.
Melhor, menos, que se divida,
feita gomos de rede sobre o solo,
que cubram o mapa, o território, vicejem.
Plantas, fontes de comida,
da vida que há na comida
nascida a cada colheita.
Vida digna
que entraria muito fundo
injetando verde
na carne do relevo.

10. Lábaro
Agora, doutor,
orgulho mesmo que eu sinto
é ver bem encaminhado
o meu menino do meio
– aquele rapagão espigado
com a calça azul na canela
e a camisa amarela,
imponente,
dos Correios.

11. Filho teu
Se chamas os teus filhos à injustiça,
ao opróbrio, à vida desumana,
teus filhos negarão os teus reclamos
ostentando galhardia insubmissa.
Se acenas com grilhões e só atiças
teus filhos com bordão e força bruta,
verás que nossa gente, resoluta,
prefere, nessa hora, a própria morte.
Mas se ergues da justiça a clava forte,
verás que um filho teu não foge à luta.
__________________
*Luiz Guilherme Piva fica olhando o horizonte do Brasil.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

O que ler neste feriadão

Feriados são sempre bem vindos, é um tempo onde podemos nos organizar, seja no trabalho ou na vida pessoal. A fim de aproveitar bem o tempo, ofereço-lhes alguns livros, mas também aceito sugestões. Divirtam-se!!!




1. A Menina que não Sabia Ler, de John Harding: embora a história se inicie num tom leve, em que a menina Florence conta que aprendeu a ler escondida e sozinha porque seu tio e tutor achava que mulheres não deviam saber decifrar os livros. Logo, no entanto, a história toma um tom sombrio, lembrando muito A Volta do Parafuso, de Henry James.


2. Você Pode Guardar um Segredo?, de Pedro Guerra: esse romance policial marca a estreia de um jovem escritor caxiense, numa trama bem elaborada passada numa fictícia cidade americana.


3. A Sombra do Vento, de Carlos Ruiz Záfon: posso dizer, sem dúvida, que este é um dos melhores livros que já li. O autor espanhol constrói uma trama repleta de suspense, numa história que começa quando o jovem Daniel, então com 10 anos, é levado pelo pai até o Cemitério dos Livros Esquecidos. Lá, encontra um romance de um maravilhoso autor desconhecido. Quando o garoto tenta encontrar outras obras desse escritor, descobre que alguém percorre o mundo queimando seus livros.


4. O Jogo do Anjo, de Carlos Ruiz Záfon: do mesmo autor do anterior, traz uma nova história, desta vez com toques de sobrenatural, em que o escritor David Martín, praticamente na miséria, recebe uma proposta de um homem misterioso para escrever um livro que mudaria o mundo. Alguns cenários de A Sombra do Vento se repetem, bem de passagem: o Cemitério dos Livros Esquecidos e a livraria da família Sempere.


5. O Prisioneiro do Céu, de Carlos Ruiz Záfon: neste livro, as tramas das duas histórias anteriores de Zafón começam a se entrelaçar. Muitas coisas deixadas inexplicadas nos outros dois livros agora ganham sentido. Embora também muito bem imaginado e escrito, no entanto, achei que faltou algo, que a história não me empolgou tanto quanto A Sombra do Vento e O Jogo do Anjo. Vamos ver como será o quarto livro, que deve dar um fecho nas tramas. 

6. Serraria Baixo-Astral, de Lemony Snickert: quarto livro da saga infanto-juvenil Desventuras em Série, traz os irmãos órfãos Violet, Klaus e Sunny Baudelaire em mais uma angustiante aventura (ou desventura), desta vez obrigados a trabalhar numa perigosa serraria, enquanto o malvado Conde Olaf continua à espreita.



7. Criança 44, de Tom Rob Smith: uma trama que une suspense, medo e traição, passada na União Soviética, num tempo em que qualquer discordância com o governo e a polícia gerava prisão e morte. Depois de mostrar duas crianças caçando um gato para matar a fome numa aldeia ucraniana, a história dá um pulo de 20 anos e vai para Moscou, em que um oficial decide investigar a morte de crianças, embora oficialmente não existam assassinatos no país.

8. Na Ilha do Dragão, de Maristel Alves dos Santos: um dos livros que eu ainda não havia lido da coleção Vaga-Lume, traz a aventura de uma turma que vai passar um feriado numa ilha. Envolve perigos, sequestro, mostros marinhos e até um tesouro.

9. A Garota de Papel, de Guillaume Musso: um escritor em crise porque foi abandonado pela namorada vê, repentinamente, uma das personagens de seus livros aparecer em carne e osso em sua vida, depois de uma falha na impressão de seu último livro.

10. A Mala de Hana, de Karen Levine: uma comovente história real sobre uma menina judia levada para um campo de concentração. Sua vida é retraçada após pesquisas de uma professora japonesa, cuja escola havia recebido uma mala que pertencera a Hana.


11. Clube Mefisto, de Tess Gerritsen: uma série de assassinatos com toques ritualísticos são o novo desafio da detetive Jane Rizzolli e da médica legista Maura Isler. 


12. Gravidade, de Tess Gerritsen: durante uma missão espacial, os astronautas começam a adoecer e morrer. Os sobreviventes não devem voltar à Terra, para não contaminar outras pessoas. Mas um ex-astronauta faz de tudo para reverter a situação, pois sua ex-mulher, por quem ainda é apaixonado, é uma das pessoas presas na Estação Espacial.


13. Pegasus e o Fogo do Olimpo, de Kate O’Hearn: durante uma tempestade, o mitológico cavalo alado Pegasus cai de repente no prédio onde mora a menina Emily, arrastando-a para uma aventura envolvendo os deuses da mitologia romana.


14. Pegasus e a Batalha pelo Olimpo, de Kate O’Hearn: sequência da história anterior, traz Emily, Pegasus e seus amigos em novas aventuras para proteger o Olimpo.


15. Os Barcos de Papel, de José Maviael Monteiro: outro excelente livro da série Vaga-Lume, traz os amigos Quito, André, Miguel e Josué, que se perdem no interior de uma caverna enquanto a exploram, e acabam em poder de bandidos.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

A herança maldita




O governo Lula recebeu uma herança maldita do governo FHC, refletida numa profunda e prolongada recessão, no desmonte do Estado, na multiplicação por 11 da dívida pública, no descontrole inflacionário. O controle da inflação jogou-a para baixo do tapete: transferiu-a para essa multiplicação da dívida pública.

O povo entendeu, rejeitou FHC e derrotou os seus candidatos: Serra duas vezes e Alckmin. Isso é história, tanto no sentido que é verdade incorporada à história do Brasil, como história porque o governo Lula, com grande esforços, superou a recessão profunda e prolongada herdada e conduziu o Brasil ao ciclo expansivo que dura até hoje.

Para não aguçar o clima de instabilidade que a direita pretendia impor no começo do seu governo, Lula preferiu não fazer o dossiê do governo FHC, que incluísse tudo o que foi mencionado, mais os escândalos das privatizações, da compra de votos para a reeleição, da tentativa de privatização da Petrobras, entre outros.

Não por acaso FHC é o político mais repudiado pelos brasileiros. Já na eleição de 2002, Serra tratou de distanciar-se do FHC. Em 2006, as privatizações, colocadas como tema central no segundo turno, levaram a uma derrota acachapante do Alckmin. Em 2010, de novo o Serra nem mencionou FHC, tentou aparecer como o melhor continuador do governo Lula, para a desmoralização definitiva do governo FHC.

Ao lado disso, economistas da ultra esquerda esposaram a bizarra tese de que não havia herança maldita, que o governo Lula era continuidade do governo FHC, que mantinha o modelo neoliberal. Além de se chocarem com a realidade das transformações econômicas e sociais do país, foram derrotados politicamente pelo total falta de apoio a essas teses no final do governo Lula, quando o candidato que defendeu essas posições, apesar de toda a exposição midiática, teve 1% dos votos.

FHC não ouve ninguém, despreza os que o cercam, mas sofre da teoria da dependência da dor de cotovelo. Dedica as pouco claras forças mentais que lhe restam para atacar Lula, cujo sucesso – espelhada no apoio de 69,8% dos brasileiros que querem Lula de volta como presidente em 2014 e nenhuma pesquisa sequer faz a mesma consulta sobre o FHC, para não espezinha-lo ainda mais – fere seu orgulho à morte.

Esses amigos tentam convencê-lo a não escrever mais, a não se expor ainda mais à execração publica – com efeitos diminutos, porque ele não ouve, seu orgulho ferido é o maior dos sentimentos que ele tem, mas também porque ninguém lê seus artigos – a se retirar definitivamente da vida pública. Cada vez que ele se pronuncia, aumentam os apoio ao Lula e à Dilma.

A historia diz, inequivocamente, que o Lula é um triunfador e FHC um perdedor. Isso a direita e seu segmento midiático não perdoam, mas é uma batalha perdida para todos eles.

sábado, 1 de setembro de 2012

Caí do mundo e não sei como voltar

Por Eduardo Galeano



O que acontece comigo, que não consigo andar pelo mundo pegando coisas e trocando-as pelo modelo seguinte, só porque alguém adicionou uma nova função ou a diminuiu um pouco?

Não faz muito, com minha mulher, lavávamos as fraldas dos filhos,pendurávamos no varal junto com outras roupinhas, passávamos, dobrávamos e as preparávamos para que voltassem a serem sujas.

E eles, nossos nenês, apenas cresceram, tiveram seus próprios filhos e se encarregaram de atirar tudo fora, incluindo as fraldas. Entregaram-se, inescrupulosamente, às descartáveis!

Sim, já sei. À nossa geração sempre foi difícil jogar fora. Nem os defeituosos conseguíamos descartar! E, assim, andamos pelas ruas, guardando o muco no lenço de tecido, de bolso.

Nããão! Eu não digo que isto era melhor. O que digo é que, em algum momento, eu me distraí, caí do mundo e, agora, não sei por onde se volta.
O mais provável é que o de agora esteja bem, isto não discuto. O que acontece é que não consigo trocar os instrumentos musicais uma vez por ano, o celular a cada três meses ou o monitor do computador por todas as novidades.

Guardo os copos descartáveis! Lavo as luvas de látex que eram para usar uma só vez.

Os talheres de plástico convivem com os de aço inoxidável na gaveta dos talheres! É que venho de um tempo em que as coisas eram compradas para toda a vida!

É mais! Compravam-se para a vida dos que vinham depois! A gente herdava relógios de parede, jogos de copas, vasilhas e até bacias de louça.

E acontece que em nosso, nem tão longo casamento, tivemos mais cozinhas do que as que haviam em todo o bairro em minha infância, e trocamos de refrigerador três vezes.

Nos estão incomodando! Eu descobri! Fazem de propósito! Tudo se lasca, se gasta, se oxida, se quebra ou se consome em pouco tempo para que possamos trocar.

Nada se arruma, não se conserta. O obsoleto é de fábrica. Aonde estão os sapateiros fazendo meia-solas dos tênis Nike? Alguém viu algum colchoeiro encordoando colchões, casa por casa? Quem arruma as facas elétricas: o afiador ou o eletricista? Haverá teflon para os funileiros ou assentos de aviões para os seleiros?

Tudo se joga fora, tudo se descarta e, entretanto, produzimos mais e mais e mais lixo. Outro dia, li que se produziu mais lixo nos últimos 40 anos que em toda a história da humanidade.

Quem tem menos de 30 anos não vai acreditar: quando eu era pequeno, pela minha casa não passava o caminhão que recolhe o lixo! Eu juro! E tenho menos de ... anos! Todos os descartáveis eram orgânicos e iam parar no galinheiro, aos patos ou aos coelhos (e não estou falando do século XVII). Não existia o plástico, nem o nylon. A borracha só víamos nas rodas dos carros e, as que não estavam rodando, as queimávamos na Festa de São João. Os poucos descartáveis que não eram comidos pelos animais, serviam de adubo ou se queimava.

Desse tempo venho eu. E não que tenha sido melhor... É que não é fácil para uma pobre pessoa, que educaram com "guarde e guarde que alguma vez pode servir para alguma coisa", mudar para o "compre e jogue fora que já tem um novo modelo". 

Troca-se de carro a cada 3 anos, no máximo, por que, caso contrário, és um pobretão. Ainda que o carro que tenhas esteja em bom estado... E precisamos viver endividados, eternamente, para pagar o novo!!! Mas... por amor de Deus! Minha cabeça não resiste tanto. Agora, meus parentes e os filhos de meus amigos não só trocam de celular uma vez por semana, como, além disto, trocam o número, o endereço eletrônico e, até, o endereço real.

E a mim que me prepararam para viver com o mesmo número, a mesma mulher, a mesma e o mesmo nome? Educaram-me para guardar tudo. Tuuuudo! O que servia e o que não servia. Porque, algum dia, as coisas poderiam voltar a servir.

Acreditávamos em tudo. Sim, já sei, tivemos um grande problema: nunca nos explicaram que coisas poderiam servir e que coisas não. E no afã de guardar (por que éramos de acreditar), guardávamos até o umbigo de nosso primeiro filho, o dente do segundo, os cadernos do jardim de infância e não sei como não guardamos o primeiro cocô.

Como querem que entenda a essa gente que se descarta de seu celular poucos meses depois de o comprar? Será que quando as coisas são conseguidas tão facilmente, não se valorizam e se tornam descartáveis com a mesma facilidade com que foram conseguidas?

Em casa tínhamos um móvel com quatro gavetas. A primeira gaveta era para as toalhas de mesa e os panos de prato, a segunda para os talheres. A terceira e a quarta para tudo o que não fosse toalha ou talheres.

E guardávamos... Como guardávamos!! Tuuuudo!!! Guardávamos as tampinhas dos refrigerantes!!! Como, para quê? Fazíamos capachos, colocávamos diante da porta para tirar o barro dos sapatos. Dobradas e enganchadas numa corda, se tornavam cortinas para os bares. Ao fim das aulas, lhes tirávamos a cortiça, as martelávamos e as pregávamos em uma tabuinha para fazer instrumentos para a festa de fim de ano da escola.

Tuuudo guardávamos! Enquanto o mundo espremia o cérebro para inventar isqueiros descartáveis ao término de seu tempo, inventávamos a recarga para isqueiros descartáveis. E as Gillette até partidas ao meio se transformavam em apontadores por todo o tempo escolar. E nossas gavetas guardavam as chavezinhas das latas de sardinhas ou de fiambre, na possibilidade de que alguma lata viesse sem sua chave.

E as pilhas! As pilhas dos primeiros radinhos transistores passavam do congelador ao telhado da casa. Por que não sabíamos bem se se devia dar calor ou frio para que durassem um pouco mais. Não nos resignávamos que terminasse sua vida útil, não podíamos acreditar que algo vivesse menos que um jasmim.

As coisas não eram descartáveis. Eram guardáveis.

Os jornais!!! Serviam para tudo: como de forro para as botas de borracha, para por no piso nos dias de chuva e por sobre todas as coisas para enrolar. Às vezes sabíamos alguma notícia lendo o jornal tirado de um embrulho de bananas. E guardávamos o papel de alumínio dos chocolates e dos cigarros para fazer guias de enfeites de natal, e as páginas dos almanaques para fazer quadros, e os conta-gotas dos remédios para algum medicamento que não o trouxesse, e os fósforos usados por que podíamos acender uma boca de fogão (Cosmopolita era a marca de um fogão que funcionava com gás) desde outra que estivesse acesa, e as caixas de sapatos se transformavam nos primeiros álbuns de fotos e os baralhos se reutilizavam, mesmo que faltasse alguma carta, com a inscrição a mão em um valete de espada que dizia "esta é um 4 de paus".

As gavetas guardavam pedaços esquerdos de prendedores de roupa e o ganchinho de metal. Ao tempo esperavam somente pedaços direitos que esperavam a sua outra metade, para voltar outra vez a ser um prendedor completo.

Eu sei o que nos acontecia: custava-nos muito declarar a morte de nossos objetos. Assim como hoje as novas gerações decidem matá-los tão-logo aparentem deixar de ser úteis. Aqueles tempos eram de não se declarar nada morto: nem a Walt Disney!!!

E quando nos venderam sorvetes em copinhos, cuja tampa se convertia em base, nos disseram: comam o sorvete e depois joguem o copinho fora! E nós dizíamos que sim, mas, imagina que a lançávamos fora!!! As colocávamos a viver na estante dos copos e das taças. As latas de ervilhas e de pêssegos se transformavam em vasos e até telefones. As primeiras garrafas de plástico se transformaram em enfeites de duvidosa beleza. As caixas de ovos se converteram em depósitos de aquarelas, as tampas de garrafões em cinzeiros, as primeiras latas de cerveja em porta-lápis e as rolhas de cortiça esperavam encontrar-se com uma garrafa.

E me mordo para não fazer um paralelo entre os valores que se descartam e os que preservávamos. Ah!!! Não vou fazer!!! Morro por dizer que hoje não só os eletrodomésticos são descartáveis; também o casamento e até a amizade são descartáveis. Mas não cometerei a imprudência de comparar objetos com pessoas.

Mordo-me para não falar da identidade que se vai perdendo, da memória coletiva que se vai descartando, do passado efêmero. Não vou fazer! Não vou misturar os temas, não vou dizer que ao eterno tornaram caduco e ao caduco fizeram eterno. Não vou dizer que aos velhos se declara a morte quando apenas começam a falhar em suas funções, que aos cônjuges se trocam por modelos mais novos, que as pessoas a que lhes falta alguma função se discrimina o que se valoriza aos mais bonitos, com brilhos, com gel no cabelo e glamour.

Esta só é uma crônica que fala de fraldas e de celulares. Do contrário, se misturariam as coisas, teria que pensar seriamente em entregar à bruxa, como parte do pagamento de uma senhora com menos quilômetros e alguma função nova. Mas, como sou lento para transitar neste mundo da reposição e corro o risco de que a bruxa me ganhe a mão e seja eu o entregue...

Dica de Fim de Semana - Caminho da Liberdade





Em 1940, pegos pelo regime stalinista, sete prisioneiros aproveitam-se da nevasca para fugir de Gulag Soviético. A liberdade desses homens tem um preço: eles têm poucas chances de chegarem a um lugar seguro sem serem pegos novamente e correm risco de morte.